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MADE IN CEARÁ

Em um país que enfrenta entraves na valorização da ciência, os pesquisadores do Ceará são referência por seu pioneirismo e inovação.


 

Atualmente é Doutoranda em Ciências Médicas pela UFC, pesquisadora do Laboratório RespLab/UFC e conteudista na empresa de ensino em ventilação mecânica Xlung.

Toda grande jornada precisa de um ponto de partida. Talvez Betina Tomaz, fisioterapeuta intensivista, não imaginasse, ao iniciar sua graduação, há mais de uma década, que no futuro seu nome constaria no rol de cientistas que integraram uma força-tarefa hercúlea de combate a um vírus pandêmico: o novo coronavírus.

Ela é uma das colaboradoras do capacete Elmo, equipamento para o suporte de ventilação de pacientes em estado crítico que dispensa a intubação. O invento estampou manchetes pelo Brasil afora e ganhou reconhecimento internacional por ter sido usado em pacientes internados com Covid-19. Recentemente, foi eleito um dos 12 vencedores do Prêmio Euro de Inovação na Saúde, iniciativa que reconhece inovações na área médica da América Latina. Às repercussões acadêmica e clínica soma-se a adesão social. Chegaram, inclusive, a fazer tatuagem dele.

Desenvolvido em tempo recorde, o Elmo foi fruto do trabalho de muitas mãos e é um produto 100% cearense. Betina explica que, por conta da sucessão de lockdowns, havia muita dificuldade na importação de insumos, de modo que os materiais utilizados para a pesquisa tinham de ser aqueles já disponíveis aqui. Entre risadas, compartilha o curioso "causo" de quando precisaram fazer medições da cervical, a fim de definir as dimensões do capacete, mas não conseguiam achar nenhuma fita métrica. Eis que, no estacionamento de um shopping em Fortaleza - cenário um tanto quanto improvável -, encontraram uma costureira que ajudou os pesquisadores, cedendo-lhes o próprio instrumento de trabalho. “Eu saí de lá falando que um dia ela ia ver o quão bem ela fez para a pesquisa nesse momento em que ela deu a fita métrica para a gente”.



O capacete ELMO é um dispositivo de suporte ventilatório não invasivo capaz de manter uma pressão positiva contínua nas vias aéreas através da oferta de alto fluxo de oxigênio e ar medicinal, reduzindo consideravelmente o esforço respiratório do paciente.

Ainda que a pesquisa que culminou na criação do Elmo tenha surgido no contexto da pandemia, a inovação daí oriunda não ficará restrita a esse triste período da história mundial. A fisioterapeuta integra o RespLab (Laboratório de Respiração da Universidade Federal do Ceará), no qual, sob orientação do professor Marcelo Alcântara Holanda, continuam a ser realizados estudos para aprimoramento do capacete e descoberta de potenciais novas formas de utilização. “A pesquisa é um mundo muito curioso: ou a pessoa odeia ou a pessoa ama, não existe meio termo. Graças a Deus, estou nesse grupo seleto que ama [a pesquisa]”, brinca.

Para ela, trabalhar no projeto - o maior de sua vida até hoje - foi transformador. “A iniciação científica deveria ser obrigatória para todo mundo na graduação porque é uma formação que dá várias oportunidades na vida profissional e faz crescer muito na vida pessoal”.



 


Assim como os estudos para criar capacete Elmo, outra pesquisa do Ceará ganhou o mundo impactando a vida de muitas pessoas. “Eu sempre gostei de fazer pesquisa, desde que eu era criança”, conta Carlos Paier, professor do departamento de Fisiologia e Farmacologia da Universidade Federal do Ceará. O menino que, ainda no Espírito Santo, brincava no quintal da avó, misturando substâncias diversas apenas pela curiosidade de ver o resultado, viria a se tornar, anos mais tarde, no Ceará, um dos nomes responsáveis pela pele de tilápia.

Desenvolvida inicialmente para auxiliar no processo de cicatrização de vítimas de queimaduras, hoje a técnica também contempla os animais, sendo utilizada em cirurgias de córneas em cães e gatos. Assim como o capacete Elmo, a pele de tilápia foi agraciada com o Prêmio Euro de Inovação na Saúde, em 2020. No ano seguinte, a pesquisa já acumulava um total de 19 prêmios.

Além de dar aulas, Paier também atua como pesquisador no Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos (NPDM-UFC), onde coordena o Laboratório de Oncologia Experimental e o Laboratório de Cicatrização. Ele revela gratidão por conseguir trabalhar fazendo o que ama desde pequeno e reconhece que essa é uma realidade rara no Brasil. Isso porque a ciência tem tempo e ritmo próprios, exigindo investimentos constantes, o que, por sua vez, contraria os interesses daqueles que buscam lucro rápido e imediato. “A pele de tilápia é uma pesquisa que tem quase nove anos, e foi dar seus primeiros resultados palpáveis no quinto ano”.

O caráter multidisciplinar do projeto é um ponto de destaque, já que o intercâmbio de informações com médicos e pacientes durante o desenvolvimento foi essencial ao sucesso da empreitada. Participar de uma pesquisa de tal porte, de relevância nacional e internacional, foi uma experiência enriquecedora profissionalmente, devido ao peso agregado ao currículo, e também pessoalmente, graças à oportunidade de ver, na prática, o impacto de seu trabalho. “Os médicos vinham todos animados nos dar a notícia de como esse produto, que a gente fez no nosso laboratório, na nossa bancada, tinha mudado a vida de algumas pessoas.”

O professor compartilha uma das histórias que mais o marcou nessa trajetória. Após um câncer de vagina, uma paciente teve oclusão do canal vaginal, impossibilitando-a de manter relações sexuais com o marido. Após várias cirurgias plásticas infrutíferas, a técnica da pele de tilápia possibilitou que a reconstrução fosse finalmente bem sucedida. “Ela se emocionava ao falar, isso restaurou a vida dela. Foi muito legal, muito gratificante receber esse testemunho e ver a emoção das pessoas que participaram do processo”, conclui.




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